COMO ENLOUQUECER O CONTRIBUINTE
A Receita Federal do Brasil reinicia os "Atos Declaratórios Executivos", ações de desenquadramento em massa, promovida desde 1999 em milhares de contribuintes. Quem não se recorda dos desenquadramentos das Escolas, Auto-escolas, Lotéricas, contribuintes com pseudodébitos com a Previdência, Empresas de Eventos, Informática, e por último as Oficinas Mecânicas.
A maioria dos desenquadramentos em massa são inconstitucionais, porque a legislação que veda a permanência nesse regime às microempresas e às empresas de pequeno porte que possuam débitos sem exigibilidade suspensa. Ofende, todavia, à Constituição Federal de 1988 a exigência de regularidade fiscal para a adesão.
Isso porque a Constituição de 1988 tem por princípio de ordem econômica o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país. E mais, determina que a União, o Distrito Federal, os Estados e os municípios dispensem a tais empresas um tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações tributárias ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.
Já no que tange ao Sistema Tributário Nacional, a Constituição diz caber à lei complementar o estabelecimento de normas gerais em matéria tributária, especialmente sobre definição de “tratamento diferenciado e favorecido” a essas empresas.
Não poderia, portanto, a Lei Complementar 123/06 — instituidora do Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte e do Simples Nacional — ter afrontado a Constituição vigente ao criar esse impeditivo de adesão ao sistema que deve obrigatoriamente ser privilegiado.
A exigência é claramente inconstitucional, pois a Constituição não previu um tratamento tributário especial apenas às pequenas empresas sem débitos fiscais ou que tenham débitos com exigibilidade suspensa, numa das formas previstas no Código Tributário Nacional.
Ora, ao adotar esse desproporcional critério de discriminação, a LC 123/06 mostrou-se muito severa, porquanto é perfeitamente normal que as empresas possam passar por dificuldades financeiras e, em conseqüência, ficar inadimplentes com suas obrigações tributárias.
Com efeito, há de se considerar o Princípio da Proporcionalidade no exame desse dispositivo restritivo, uma vez que não se pode olvidar que a Constituição buscou justamente dar condições especiais de desenvolvimento às microempresas e empresas de pequeno porte, pois elas são fortes geradoras de emprego e renda, constituindo a base de sustentação da economia brasileira.
Da forma como foi editada a LC 123/06, as pequenas empresas devedoras ao fisco estão coagidas a regularizar seus débitos tributários, sob pena de terem de arcar com uma carga tributária mais pesada, dentro do regime geral a que os demais contribuintes estão sujeitos.
Vale lembrar ainda o fato de o fisco já dispor de uma força legal de coerção para a cobrança dos débitos dos contribuintes.
Enfim, a LC 123/06 infringe princípios de ordens econômica e tributária ao exigir a regularidade fiscal como condição para aderir ao Simples Nacional, mormente quando se pondera o meio utilizado por essa norma e o fim pretendido pela Constituição.