Serventuária da Justiça que publicou informação inverídica não responderá em ação de indenização
Uma servidora da Justiça que publicou equivocadamente informação de que o estado do Paraná havia sido condenado por litigância de má-fé não responderá por danos morais em ação movida pelo procurador que atuou no caso, pois não ficou caracterizada a existência de dano indenizável. O entendimento foi proferido pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O procurador do estado do Paraná ajuizou ação de indenização por danos morais contra a escrivã, lotada na 1ª Vara de Fazenda Pública, Falências e Concordatas de Curitiba. A serventuária publicou resumo de sentença no qual constou que o estado fora condenado a pagar multa por litigância de má-fé. Tal fato, na realidade, não aconteceu.
O procurador alegou que a publicação errônea lhe causou “graves danos”. Sustentou que foi atingido em sua honra pessoal e profissional. Baseado nessas razões, apresentou ação diretamente contra a servidora pública.
O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido, por ter considerado o fato “mero dissabor”, incapaz de gerar reparação financeira. A tese foi mantida na apelação pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR). Inconformado com o acórdão, o procurador apresentou recurso no STJ.
Ação direta
Na Quarta Turma, órgão julgador especializado em direito privado, os ministros lembraram que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) “sempre foi linear em admitir a ação direta do lesado em face do servidor público”.
Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso, cabe ao suposto lesado avaliar se deseja ajuizar ação contra o servidor público ou contra o estado. “Se, por um lado, o particular abre mão do sistema de responsabilidade objetiva do estado, por outro também não se sujeita ao regime de precatórios”, disse ele.
O ministro garantiu que o servidor pode responder diretamente pelo dano gerado por atos praticados no exercício de sua função pública, “sendo que, evidentemente, o dolo ou culpa, a ilicitude ou a própria existência de dano indenizável são questões meritórias”.
Incorreções corriqueiras
Entretanto, de acordo com Salomão, nesse caso não houve dano moral a ser indenizado.
Para o relator, “a publicação de certidão equivocada de ter sido o estado condenado a multa por litigância de má-fé gera, quando muito, mero aborrecimento ao procurador que atuou no feito”.
Ele disse que são corriqueiras no âmbito forense as incorreções em comunicação de atos processuais, “notadamente em razão do volume de processos que tramitam no Judiciário”.
Salomão destacou que a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido que “mero aborrecimento, contratempo, mágoa ou excesso de sensibilidade” por aquele que diz ter sofrido o dano moral “são insuficientes para a caracterização do abalo moral indenizável”. Mesmo porque, para o relator, é de amplo conhecimento que a multa por litigância de má-fé é atribuída à parte e não ao advogado.
Embora tenha reconhecido que, quando se trata de dano moral, é “impossível exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia”, o ministro observou que nem por isso se pode concluir que todo e qualquer ato ilícito gera dano moral indenizável.
Conforme ponderou Salomão, a existência do dano moral não é extraída da prova de sua ocorrência, mas da análise da gravidade do ato ilícito em abstrato. Para ele, é a comprovação da gravidade do ato ilícito que gera o dever de indenizar.
Inércia
Salomão lembrou ainda que, depois da publicação equivocada, o recorrente apresentou embargos e nada mencionou quanto ao erro, também não fez nenhuma menção na apelação que se seguiu e não requereu administrativamente a correção da publicação.
De acordo com o relator, “se houvesse algum dano indenizável, cabia a ele próprio mitigar as consequências do fato, por força de evidente imperativo ético ancorado na boa-fé objetiva que deve permear todas as relações sociais, sejam elas contratuais, extracontratuais ou com o poder público”.
O ministro explicou que, embora a inércia dolosa não tenha sido demonstrada nos autos, a parte que se sentiu lesada não deve se manter inerte propositadamente diante da “possibilidade de agravamento desnecessário do dano, na esperança de se ressarcir posteriormente com uma ação indenizatória”, pois esse comportamento afronta os deveres da ética e da boa-fé.